A pandemia de Covid-19 trouxe a necessidade do distanciamento social e o isolamento em casa como forma de prevenção da doença, principalmente antes da vacina. Neste cenário, os idosos, que integram o grupo mais vulnerável ao coronavírus, vivenciaram a solidão de forma ainda mais intensa, o que, em alguns casos, resultou no declínio da saúde mental e das funções cognitivas.
Segundo a psicóloga Erica Prudente, coordenadora do Núcleo de Atendimento Especializado ao Idoso do Instituto de Ação Social Enéas Tognini, em Diadema, região metropolitana de São Paulo, a ansiedade, depressão e o sentimento de pânico foram as principais queixas entre seus pacientes durante este período.
“Eles se sentiram muito sozinhos em vista do distanciamento dos familiares. A pandemia também trouxe um peso muito grande do medo: medo de pegar doença, de perder pessoas, de lidar com o luto, porque alguns idosos perderam parentes, irmãos e filhos para a Covid”, afirma.
Além de lidar com a solidão, a psicóloga ressalta que o principal desafio para os idosos foi ressignificar a permanência em casa, o que já foi visto de forma negativa no que diz respeito ao envelhecimento saudável.
“Por muito tempo nós trabalhamos na promoção do envelhecimento ativo, para o idoso sair, fazer exercício. Na pandemia, com a questão do risco da doença, nós tivemos que fazer um trabalho contrário, e isso teve um impacto muito grande também na formação emocional deles. Tivemos que propor ressignificar o ficar em casa”, explica Erica.
Palavra cruzada, jogos de memória e atividade física com objetos disponíveis em casa foram algumas das alternativas propostas pela psicóloga para os idosos atendidos pelo instituto enquanto as atividades presenciais estavam suspensas. Os estímulos, segundo Erica, são necessários para que a parte física e cognitiva seja preservada.
“Algumas estatísticas do instituto mostram que os idosos que tiveram estímulos durante a pandemia voltaram para os serviços presenciais mais interativos, não tiveram perdas significativas na cognição. Agora aqueles que se mantiveram com dificuldade de medicação e sedentários, retornaram com algumas regressões no sistema cognitivo, com mais dificuldades para aprender, para realizar atividades de memória e de coordenação”, afirma.
A experiência do luto, seja coletivo ou individual, tem marcado a pandemia, sobretudo no Brasil, onde o número total de mortos por Covid-19 se aproxima dos 600 mil. No caso dos idosos, a psicóloga ressalta que a questão da longevidade torna o processo ainda mais difícil, porque eles vivenciam mais perdas ao longo da vida.
“Viver o luto é muito importante para a saúde emocional, porque o luto não significa a perda da pessoa, mas a perda da própria existência do ser. É um telefonema que não vai receber mais, um carinho, um eu te amo. Trabalhar com todas essas questões de finitude para os idosos é um processo muito difícil considerando a própria cultura que nós vivemos da desvalorização do idoso”, ressalta.
Fundamental não só para que a elaboração do luto ocorra de forma saudável, como também para que o processo de envelhecimento seja experienciado de forma plena, o acompanhamento psicológico ainda é um tabu entre os idosos.
“Eles têm muita resistência de se vincularem aos serviços de psicologia, porque o idoso ainda tem aquele preconceito de que terapia é coisa para louco, que por fazer um acompanhamento psicológico ele está assumindo que está perdendo a lucidez”, afirma a psicóloga.
“Por outro lado, aqueles que conseguiram se vincular, vemos o ganho da terapia no sentido de fazer com que eles se autoconheçam na terceira idade, que eles consigam trabalhar a imagem dessa nova realidade do envelhecimento e lidar melhor com todos os fatores que fazem parte desse momento”, ressalta.
O adoecimento mental para esta faixa etária pode impactar a saúde como um todo, explica a geriatra Daniela Gomez, da SBA Residencial (Sociedade Beneficente Alemã). De acordo com a médica, desânimo, alteração do sono e do apetite são alguns dos sinais que podem indicar que o idoso está vivenciando algum prejuízo do seu bem-estar mental.
“O idoso que se sente solitário, sem interação social, pode evoluir para depressão, o que pode acarretar prejuízo na funcionalidade, na cognição, levando, inclusive, a problemas de memória. Além disso, pode dificultar o tratamento de outras doenças e piorar a qualidade de vida”.
Além disso, a psicóloga Erica Prudente destaca que sinais de irritabilidade e sensibilidade à convivência, além de choro frequente e tristeza, já são indicativos de que o idoso precisa passar por uma avaliação neurológica para que não haja perda da cognição. Neste sentido, a família é a maior aliada.
“O Estatuto do Idoso tem como direito fundamental a convivência familiar. O processo social na vida do idoso é fundamental para sua saúde emocional. Então, a família deve dar apoio, valorizar os seus idosos e exercer essa proteção que eles tanto precisam para desenvolverem um envelhecimento saudável”, diz a psicológa.
Fonte: https://noticias.r7.com/
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